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2020 #5 - "Monoceros"

Publicado por Flur Discos em

Ao longo do mês de Dezembro destacamos um disco por dia. Novidades 2020, reedições ou, até, edições de anos anteriores. A essência é que seja um disco com significado para nós ao longo dos últimos meses. Num ano atípico para todos, mas também num período de grande mudança para a Flur.

2020 foi um ano que aprendemos novas técnicas de comunicação? Ideias de trabalho que se julgavam impossíveis numa semana, tornaram-se possíveis na seguinte. A realidade obrigou a assimilar a mudança e a congeminar um modelo para o futuro. Enquanto isso, “Monoceros” de Evan Parker era reeditado. Disco de 1978 da Incus, fundada por Derek Bailey, Tony Oxley e Evan Parker, cujo catálogo tem sido recuperado pela Honest Jon’s e os seus tentáculos, como esta Treader.

Eis o que se passa: “Monoceros” é o tipo de acontecimento que se calhar assusta num ano em que estivemos lá dentro. É música de quarto fechado que se expande para todos os lados. O quarto fechado é habitado por criação, sempre a circular e a expandir-se. “Monoceros” – que é nome de constelação – é música cheia de possibilidades. Essas possibilidades foram bem-vindas em 2020, mesmo que o cartão de visita não seja o mais perceptível.

É, como escreveu a Wire, “uma afirmação musculada”, pela forma como Evan Parker usa o saxofone, o faz soar e viajar, e exerce até ao limite a construção de uma linguagem através da música. Como se comunicasse, usando o som como uma expressão expectável e, também, como um lugar físico onde prende o ouvinte e o ensina este som.

Isto acontece sem que seja um monólogo; é um diálogo, primeiro, entre Evan Parker e o saxofone e, posteriormente, entre os dois e o ouvinte. Escrita automática em som, ultrapassando as formas e fórmulas do jazz e a adivinhando o que seria a glitch música uma década e picos depois, por uma via acústica e inesperada.

Tudo isto usando diferentes técnicas com a língua e de respiração circular, enquanto faz nascer caos e vida com múltiplas notas num frenesim de conquista. Magnífico em 1978, a história tornou-o essencial. 2020 relembrou-nos de como precisamos de música assim.